O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, defendeu nesta semana a possibilidade de indiciamento de parlamentares por crimes contra a honra cometidos em discursos no exercício de seus mandatos. A declaração foi feita na terça-feira, 3 de dezembro, e abordou a recente atuação da Polícia Federal, que indiciou os deputados federais Cabo Gilberto Silva (PL-PB) e Marcel van Hattem (Novo-RS). Os dois congressistas são acusados de calúnia e difamação após críticas feitas no Plenário ao delegado Fábio Alvarez Shor, responsável por investigações relacionadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
Na visão de Lewandowski, imunidade parlamentar não é um salvo-conduto para discursos ofensivos. Ele argumentou que “se, da tribuna, um deputado cometer um crime contra a honra, seja contra colega ou qualquer cidadão, ele não tem imunidade em relação a isso”. Essa posição, no entanto, contrasta com decisões anteriores do ministro quando ele integrava o Supremo Tribunal Federal (STF).
Em 2021, Lewandowski rejeitou uma queixa-crime apresentada pelo empresário Luciano Hang contra o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), atual ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social do governo Lula. Na ação, Hang alegava que Pimenta o havia ofendido em um vídeo publicado no Twitter, em 2019. Na gravação, o parlamentar acusava o empresário de envolvimento em crimes fiscais e outras irregularidades, além de criticar seu apoio ao então presidente Jair Bolsonaro.
Na ocasião, Lewandowski decidiu que as declarações de Pimenta estavam protegidas pela imunidade parlamentar prevista no Artigo 53 da Constituição Federal, que assegura aos congressistas liberdade de opinião, palavras e votos no exercício do mandato. Mesmo reconhecendo que os comentários do deputado eram “contundentes e até mesmo com acidez acentuada”, o então ministro do STF destacou que a proteção constitucional visava garantir a independência e a autonomia dos parlamentares.
Lewandowski fundamentou sua decisão na jurisprudência consolidada do Supremo, que entende que a imunidade parlamentar é essencial para o livre exercício do mandato. Segundo ele, a proteção busca assegurar que os congressistas atuem com liberdade e destemor, promovendo o interesse público. Na decisão, afirmou que “a imunidade material está amparada em jurisprudência sólida desta Corte, como forma de tutela à própria independência do parlamentar”.
A divergência entre o posicionamento atual de Lewandowski e sua decisão anterior gerou questionamentos e críticas. Para analistas políticos e jurídicos, o episódio expõe a complexidade do debate sobre os limites da imunidade parlamentar. A questão ganha ainda mais relevância em um momento de polarização política e intensificação das tensões entre os poderes Legislativo e Executivo.
Os recentes indiciamentos de Cabo Gilberto Silva e Marcel van Hattem pela Polícia Federal intensificaram esse debate. Ambos os deputados criticaram duramente o delegado Fábio Alvarez Shor em discursos no Plenário, questionando sua atuação nos inquéritos que envolvem o ex-presidente Bolsonaro. As acusações de calúnia e difamação partiram dessas manifestações, que, segundo os parlamentares, estariam protegidas pela imunidade prevista na Constituição.
Enquanto Lewandowski, como ministro da Justiça, defende uma interpretação mais restritiva da imunidade parlamentar em casos de ofensas contra a honra, críticos apontam a incoerência com sua atuação no STF. Para eles, as declarações atuais contrastam com sua decisão em favor de Paulo Pimenta, na qual ele destacou a proteção ampla garantida aos congressistas.
O caso também reacende discussões sobre a aplicação seletiva de princípios jurídicos conforme os envolvidos e o contexto político. Para apoiadores de Bolsonaro e críticos do governo atual, o tratamento dado a Cabo Gilberto Silva e Marcel van Hattem reflete um rigor maior em relação a opositores do governo, enquanto aliados da administração petista, como Paulo Pimenta, teriam recebido proteção ampliada.
Por outro lado, defensores do posicionamento de Lewandowski argumentam que a imunidade parlamentar não pode servir de escudo para ataques pessoais ou crimes contra a honra, independentemente da filiação política do parlamentar envolvido. Eles afirmam que as críticas feitas a agentes públicos, como o delegado da Polícia Federal, não podem ultrapassar os limites da urbanidade e do respeito.
A questão dos limites da imunidade parlamentar é um tema que deverá permanecer em debate nos tribunais e na sociedade, especialmente à medida que se acumulam casos envolvendo discursos acalorados e a polarização do ambiente político brasileiro. Enquanto isso, as decisões do STF e de seus ex-ministros, como Lewandowski, continuarão a ser escrutinadas à luz do impacto que têm sobre a interpretação e a aplicação da Constituição.